Uma mulher esguia de sobrancelhas expressivas, cabelos pretos como o véu da noite e bochechas rosadas como quem está sempre a sentir vergonha, nunca gostou de holofotes quaisquer sobre si, nunca gostou da ideia de chamar ou ter atenção, sempre fora muito sozinha e ao contrário do que muito se pensa, gostava de ser assim, tinha um certo e desprovido tipo de aversão ao zelo do outro para consigo, no entanto, era algo natural, e por natural, tinha se habituado como ninguém aquela roupagem, essa era a sua eu do avesso em sua completude, parecia cruel olhando assim de longe, mas era apenas seu senso pragmático da alma.
Gostava de provar do gosto ácido da liberdade individual, de não ter que lidar com expectativas alheias e, com isso, não frustar ninguém com sua total incapacidade de abrir espaços.
Contava quanto lhe davam e não aceitava dar menos ou mais, tinha de ser com exatidão, tinha de ser na mesma moeda. Era objetiva, sagaz, precisava de sentenciar as coisas, pessoas e situações, precisava de enxergar à frente do seu nariz e sempre quis crer que suas sentenças eram certeiras, que eram feitas na melhor das intenções.
Não irritava, não incomodava, não protestava, não e não… Ela era calma, sutil, soava como uma caixinha de música com a bailarina a girar ou mesmo como uma ensaiada composição de Mozart.
Não adiantou, nada adiantou quando aquela criatura entrou na sala, o senso pragmático da alma começou a desregular-se e, agora, ela estava naquele show frenético e dúbio que toda uma geração conhecia, menos ela: a luta entre a razão e a emoção.
Ao vivo.
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